5 pontos para entender o que está acontecendo com o Nubank

Queda das ações do Nubank tem relação com a perspectiva de que até US$ 26 bilhões em papéis sejam negociados no mercado a partir do dia 17

Cofundadores do Nubank Edward Wible, David Vélez e Cristina Junqueira, na estreia da fintech na NYSE, em Wall Street
12 de mayo, 2022 | 05:46 PM
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Bloomberg Línea — Quando o Nubank (NU) foi à Bolsa em dezembro de 2021, levou pessoas que normalmente não investiam em renda variável. O Nubank promoveu sua oferta pública inicial (IPO), dando a 7,5 milhões de clientes os chamados BDRs (recibos de ações) para que seus correntistas fossem investidores da empresa.

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Isso fez com que mais olhos - além dos traders tradicionais - virassem para os papéis da fintech, fazendo memes sobre o valor da empresa, atraindo atenção para a queda da fortuna do CEO David Vélez e se perguntado o que está acontecendo com o Nubank. A fintech perdeu mais de um terço de seu valor de mercado menos de cinco meses depois de abrir seu capital.

A Bloomberg Línea listou, com auxílio do economista e professor da FGV Roberto Kanter, cinco pontos para entender a queda do preço das ações do Nubank.

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1 - Warren Buffett talvez tenha distorcido o valuation da fintech do cartão roxo quando se predispôs a pagar US$ 500 milhões por 1,67% do Nubank

Para o professor da FGV, o valuation do Nubank quando era uma empresa privada talvez tenha sido criado por uma distorção.

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O Nubank chegou a ser avaliado em US$ 30 bilhões em junho de 2021, depois que o bilionário investidor Warren Buffett, por meio de sua empresa Berkshire Hathaway, pagou US$ 500 milhões por 1,67% das ações da fintech. “Quando você pega esses US$ 500 milhões e divide por 1,67 isso diz que o Nubank vale US$ 30 e poucos bilhões. Mas não é que ele vale US$ 30 e poucos bilhões porque ninguém pegou 100% das ações e vendeu 100% das ações para alguém. Alguém vendeu 1,67% das ações. E alguém se predispôs a pagar US$ 500 milhões. E essa negociação de como chegou aos US$ 500 milhões sinceramente é um mistério”, opina Kanter.

Enquanto o valor dos bancos tradicionais, Santander (SANB11), Itaú (ITUB4), Bradesco (BBDC4) e outros bancos “incumbentes” do mundo é baseado em uma relação direta da sua rentabilidade e da consolidação dos seus produtos e serviços dentro de um ambiente maduro, o valor de mercado do Nubank foi baseado em um preço pago por uma microfração do seu valor, segundo o professor.

O Nubank fez um IPO a um valuation de US$ 41,5 bilhões e foi a instituição financeira mais valiosa da América Latina, superando o Itaú.

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Agora, a empresa perde até para o Santander.

Alguém vendeu 1,67% das ações. E alguém se predispôs a pagar US$ 500 milhões. E essa negociação de como chegou aos US$ 500 milhões é um mistério.

Roberto Kanter, economista e professor da FGV

Para o economista, o montante pago por Buffett pelo pedacinho do Nubank foi baseado em uma visão de mercado que tem relação com o valuation da fintech anos antes, desde as primeiras captações quando os investidores pagaram na Série A, B em diante.

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“É importante lembrar que o Nubank cresceu muito rápido, lançou-se muito rápido, teve uma proposta de valor muito interessante”, disse Kanter. Isso levou o mercado financeiro a focar no crescimento da fintech. “O preço de uma ação reflete 10% ou 20% do seu resultados de curto prazo. 80% do preço de uma ação reflete a perspectiva de resultado futuro. Todo valuation do Nubank não é baseado no resultado de hoje, mas no seu resultado do amanhã, no médio e longo prazo. Mas uma das coisas que leva a ação é que talvez o valuation dado para o Nubank seja na verdade muito maior do que aquilo que realmente vale”, disse o professor, em entrevista à Bloomberg Línea.

Talvez o valuation dado para o Nubank seja muito maior do que aquilo que ele realmente vale.

Roberto Kanter, economista e professor da FGV

“É possível fazer uma analogia a por que uma Tesla (TSLA) vale mais do que uma General Motors (GM). Não vale mais do que uma GM por causa do resultado da operação de hoje. Vale mais por uma perspectiva de médio e longo prazo, já que o mercado enxerga que a Tesla está mais preparada para os próximos 50 anos do que uma General Motors. Se ela está ou não está, se ela vai entregar essa expectativa para o mercado, não sabemos, a mesma coisa aconteceu em relação ao Nubank”, explica o professor.

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O Nubank criou seu modelo de negócio focado em uma visão digital, sem burocracias e sem taxas e vendeu a ideia para o mercado de que no médio e longo prazo a empresa teria um ganho de escala e uma possibilidade e visão de negócios muito mais moderna e contemporânea do que os bancos tradicionais, como se, a longo prazo, o Nubank fosse uma Tesla e os grandes bancos uma GM.

“Só que isso nem sempre se defronta com a realidade”, disse Kanter.

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2 - O valor das empresas de tecnologia em todo o mundo tem caído

O crédito, o dinheiro para empresas de tecnologia que são grandes demandadoras de dinheiro, está mais caro. É mais caro financiar uma empresa que não dá lucros substanciais no curto prazo. Os financiamentos diminuíram porque o aumento da taxa de juros no mercado mundial os deixam mais caros.

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Embora as taxas de juros tenham subido também no Brasil, o resultado está mais relacionado ao Federal Reserve aumentando os juros nos Estados Unidos para conter a inflação recorde americana. Isso faz com que uma boa parte do dinheiro que antes era disponibilizado para mais ativos de risco e empresas de tecnologia agora seja aplicado em renda fixa, para render em um patamar de juros maior, com menor risco.

3 - Existe também uma visão do mercado de que a inflação brasileira somada à taxa Selic faz com que o crédito no Brasil seja mais complicado

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Com os investidores mais preocupados com a qualidade do crédito e inadimplência durante a crise, as ações caem pelas perspectivas que o Nubank tenha um resultado menor.

“Não podemos esquecer que é muito lindo não cobrar taxa de lugar nenhum, mas quanto menos custos fixos, mais a empresa depende da renda do negócio. O Nubank é um banco, e banco é um intermediário financeiro. O Nubank não empresta o dinheiro dele. Ele empresta o dinheiro dos outros”, explica Kanter.

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A fintech, diferentemente dos bancos, é muito dependente de dinheiro de terceiros, enquanto os bancos tradicionais têm capital próprio, lucro e resultados suficientes para investir. “Itaú, Bradesco e Santander não precisam captar dinheiro no mercado para seus investimentos em tecnologia. E eles estão muito mais maduros, têm operações de captação, licenciamento, leasing, seguros, toda a capilaridade que os bancos de varejo tem no Brasil já estão maduras, não há nada inédito. Dezenas de milhões de pessoas comercializam esses produtos, diferente de em uma fintech”, afirma o professor.

O Nubank teria que captar dinheiro barato para conceder crédito. Mas a empresa não capta porque os juros para tomar crédito subiram. O Nubank paga mais caro pelos juros, e quando vai emprestar esse dinheiro - que é onde o banco ganha - ele talvez corra mais riscos por uma inadimplência e dificuldade de confiar em quem ele vai conceder limites.

“Ou o Nubank vai ser muito seletivo na hora de entregar o empréstimo e com isso vai perder rentabilidade, ou ele corre o risco de emprestar mais, mas ao mesmo tempo ter dificuldade de receber. Isso também é uma razão pela qual em uma visão de curto a médio prazo as ações caem”.

4 - Aumento de concorrência

O Nubank praticamente não tinha concorrentes fintechs quando foi lançado. Com o aumento de investimentos de venture capital na América Latina, vários bancos digitais surgiram com a ideia de ser “o novo Nubank”.

C6, Inter, Neon, alt.bank, são alguns dos concorrentes com o cartão colorido que também apostaram em contas digitais e sem taxa. “Hoje o Nubank vê uma quantidade grande de concorrentes, cada vez melhor estruturados, oferecendo serviços e produtos idênticos a ele. Isso faz com que a perspectiva de ganhos futuros seja menor”.

5 - Pressão do final de lock-up de ações

Uma boa parte da queda das ações do Nubank tem relação com a expectativa de que haverá uma oferta muito grande de ações da empresa no mercado. “Na lei da oferta e demanda, quanto mais ações disponíveis, menor o preço. Só que o preço já caiu antes das ações estarem no mercado”, disse o professor.

Isso acontece porque quando o Nubank fez o IPO, uma enorme quantidade de ações não foi vendida, já que há acionistas da empresa - primeiros funcionários que detém participações, por exemplo - que não podiam comercializar seus papéis logo após o IPO. Eles precisavam aguardar um período. Período esse que acaba no dia 17 de maio, quando as ações estarão liberadas para serem vendidas.

Esse montante de ações - US$ 26 bilhões em ações - que poderá ser comercializado pressionam os papéis, já que o mercado acredita que os acionistas primários podem buscar liquidez, vendendo suas participações. “O mercado antecipou um movimento de venda de ações que ainda não aconteceu. Cai o preço porque, achando que quando todo mundo vai vender, o mercado acredita que o preço vai cair. O mercado financeiro tem esse lado mágico de antecipar coisas”.

O Nubank publicará seus resultados do primeiro trimestre de 2022 no próximo dia 16. Segundo Kanter, o mercado espera o primeiro trimestre de forma positiva, principalmente após o primeiro lucro que a empresa gerou em 2021. “Foi um lucro tímido, mas foi um lucro. Não há razão alguma para que esse lucro do primeiro trimestre de 2022 não seja bem maior do em 2021 e a tendência do Nubank, principalmente com a alta de juros, é o aumento da rentabilidade. Dificilmente o banco perde dinheiro”.

O professor lembra que nos primeiros anos de vida, o Nubank gastou muito dinheiro para se tornar o maior banco digital da América Latina, mas hoje o processo de crescimento dele é menor e a fintech está muito mais interessada em rentabilidade e margem do que crescimento.

“O mercado tem uma expectativa positiva para o primeiro trimestre de 2022 e assim por diante. Entretanto, o primeiro trimestre de 2022 reflete as condições atuais. O mercado financeiro reflete o preço das ações do Nubank menos nos resultados do primeiro trimestre e muito mais na percepção do mercado para o futuro”.

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Isabela  Fleischmann

Jornalista brasileira especializada na cobertura de tecnologia, inovação e startups

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