O herdeiro do Itaú, o economista e o projeto na Amazônia que será visto da lua

Como João Moreira Salles ajudou Bernardo Strassburg a atrair investidores para restaurar um milhão de hectares de florestas

Bernardo Strassburg, Thiago Picolo e Ricardo Rodrigues lideram o projeto que quer restaurar um milhão de hectares da Amazônia e da Mata Atlântica
14 de abril, 2022 | 02:26 AM

Bloomberg Línea — Foi durante um café da manhã em Belém do Pará que o economista Bernardo Strassburg apresentou ao documentarista e herdeiro do Itaú Unibanco João Moreira Salles um projeto que poderia deixar não apenas um legado ambiental, mas um empreendimento possível de ser visto do espaço.

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A ideia: restaurar um milhão de hectares de terras degradadas da Amazônia e da Mata Atlântica e, com o trabalho concluído, transformar essas áreas em unidades de conservação ambiental. Um milhão de campos de futebol colocados lado a lado poderiam ser avistados a olho nu da lua.

Moreira Salles olhou o plano do negócio, analisou e disse ter gostado da ideia, mas que precisaria de ajuda para avaliar a viabilidade econômica do projeto e para atrair outras fontes de financiamento. Afinal, projetos de restauração florestal demandam, por essência, um alto investimento inicial e retornos de longo prazo. Os escolhidos foram a gestora Lanx Capital, dos sócios Marcelo Barbará e Marcelo Medeiros, a Gávea Investimentos, do ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga e a Dynamo, uma das mais renomadas gestoras de investimentos do Brasil.

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A primeira rodada de captação levantou R$ 389 milhões, porém, os investidores tinham apetite para mais. Com os recursos, Strassburg ligou para Ricardo Rodrigues, professor da Universidade de São Paulo, fundador do Bioflora, um dos principais viveiros de mudas nativas da Mata Atlântica do Brasil e um dos maiores especialistas em restauração florestal do país. Na sequência, Thiago Picolo, ex-presidente da rede Hortifruti Natural da Terra, comprada pela Americanas no ano passado por R$ 2,1 bilhões, recebeu o convite para ajudar a comandar o projeto que, naquele momento, havia se transformado em uma empresa chamada re.green.

O plano

Aparentemente simples, o plano é restaurar 1 milhão de hectares de áreas degradadas, essencialmente pastagens, ao longo dos próximos 12 anos. Em números mais simples, seria como restaurar quase 10 hectares de terras todos os dias até 2034. A primeira rodada de investimentos vai garantir o início da operação, mas está longe de ser o suficiente para bancar os 12 anos de trabalho. A estimativa é que sejam necessários cerca de R$ 15 bilhões para concluir a restauração de 1 milhão de hectares de mata nativa.

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Uma segunda rodada de captação até está nos planos da re.green daqui dois ou três anos, mas a ideia é que boa parte do investimento venha a partir da própria geração de caixa da companhia. A partir do final do segundo ano e início do terceiro, a restauração florestal já começa a gerar créditos de carbono que podem ser comercializados no mercado. Cada crédito equivale a 1 tonelada de CO2 equivalente que, atualmente, no mercado voluntário de créditos da Europa vale cerca de 80 euros.

“As peças do quebra cabeça da re.green começaram a se encaixar apenas há três anos, quando o mercado de carbono começou a dar sinais de aquecimento. Antes disso, era difícil um projeto como esse encontrar viabilidade econômica”, afirma Strassburg. De fato o mercado está aquecido. Para o plantio das áreas que ocorrerá ainda neste ano, já existem duas negociações avançadas, com minutas de contrato sendo trocadas, com dois compradores interessados nos créditos que ainda serão gerados.

Mas não é apenas da venda de créditos que a empresa pretende sobreviver. Por se tratar de um projeto de restauração e não simplesmente de reflorestamento, a ideia é criar toda uma biodiversidade que permita a exploração econômica sustentável e garanta fontes de receita diversificadas, não deixando a empresa exposta apenas à venda de créditos. “Essa é a diferença entre entre se plantar árvores e construir uma floresta. Você não apenas mitiga a emissão de carbono, mas agrega benefícios à comunidade e à biodiversidade. Com isso, o mercado paga até cinco vezes mais pelos créditos gerados dessa maneira”, afirma Picolo.

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Onde será restaurado

O mapeamento das áreas passíveis de serem restauradas está avançado. Os primeiros trabalhos vão ocorrer no sul da Bahia e no Pará e a modelagem sobre o que cada uma das regiões pode gerar de receita de de benefícios sociais e ambientais já está pronta. “Estamos também olhando para regiões mais ao sul como Rio de Janeiro, São Paulo e Minas Gerais, mas com o objetivo de gerar o maior impacto possível”, diz Rodrigues.

Nos planos da empresa não está apenas a aquisição direta das terras. Inclui também a parceria com entidades públicas e privadas, que detenham áreas degradadas, mas que garantam a permanência das áreas restauradas. Só em unidades de conservação já instaladas, sob gestão federal, estadual ou municipal, existem 3 milhões de hectares de áreas degradadas, muitas que viraram pastos, outras que passaram por queimadas, mas todas que não conseguiram ser recuperadas pelo Estado, segundo Strassburg.

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Além disso, nem toda área que entrar para o portfólio de gestão da re.green será 100% restaurada do zero. Rodrigues explica que existem níveis de degradação e alguns exigem mais investimentos do que outros. A expectativa é que dos 1 milhão de hectares, de 30% a 40% demandarão um trabalho completo de restauração.

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Alexandre Inacio

Jornalista brasileiro, com mais de 20 anos de carreira, editor da Bloomberg Línea. Com passagens pela Gazeta Mercantil, Broadcast (Agência Estado) e Valor Econômico, também atuou como chefe de comunicação de multinacionais, órgãos públicos e como consultor de inteligência de mercado de commodities.

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